A Câmara Municipal de Cascais (CMC) anunciou há cerca de sete anos o propósito de avançar com a criação de um espaço museológico dedicado à Artilharia de Costa e à Fortificação Marítima na História de Portugal, enquadrado num parque verde para usufruto da população. Este projecto resultaria da recuperação da 2.ª Bateria do Regimento de Artilharia de Costa (RAC), existente no alto da Parede, mais propriamente no cimo do Monte de Santa Luzia. Entretanto, as negociações para passar da intenção à concretização do projecto ainda decorrem, sem que as partes envolvidas no processo consigam chegar a acordo.
Ao que se sabe, o novo museu tem sido discutido ao longo dos anos entre os vários organismos ligados ao projecto, sem que tenha sido possível para já transformar o equipamento museológico prometido numa realidade fora do papel. Os representantes da autarquia cascalense têm reunido com o Exército Português e com o Ministério da Defesa para tentar desbloquear a situação e estudar a melhor forma de implementar o museu no espaço ocupado pelas instalações militares, entretanto desactivadas. No que lhe diz respeito, a CMC fez saber estar interessada em avançar com o projecto e chegou mesmo a efectuar trabalhos de limpeza dos terrenos.
Com a situação ‘adormecida’ num impasse, apesar do protocolo de intenções assinado entre o Exército Português e o Município cascalense em 2014, as instalações militares continuam a degradar-se, vulneráveis a actos de vandalismo e roubos. De acordo com residentes no alto da Parede que vivem próximo do local e outras fontes que têm visitado a zona, o espólio que devia ser preservado e exposto no museu tem sofrido danos e subtracções “muito significativos”. Situação que tem causado preocupação junto daqueles que têm seguido com atenção o desenvolvimento do processo para implantar este novo equipamento cultural.
Quem visitou mais recentemente aquelas instalações militares, acessíveis através de inúmeros buracos existentes na cerca de rede que as rodeia (há quem ali passeie os cães, namorados que procuram um lugar mais isolado, jovens que grafitam o que por lá se encontra, canhões incluídos, simples curiosos e quem deseje apenas desfrutar da paisagem deslumbrante que dali se avista desde a Baía de Cascais até à linha do horizonte com o Cabo Espichel em contraluz), pôde constatar o estado de abandono a que foi votado aquele espaço privilegiado. As peças de artilharia degradam-se a olhos vistos, as estruturas ainda existentes estão à beira do colapso, há lixo espalhado pelo chão… o espaço museológico está cada vez mais em risco.
“Património edificado e exemplar único no País, o Forte da Bataria de Artilharia de Costa na Parede vai transformar-se em breve no Museu Militar de Artilharia de Costa, rodeado por um jardim e parque temático para usufruto da população”, anunciou a CMC em Fevereiro de 2014, realçando o desejo de que o novo museu pudesse passar rapidamente do papel para a realidade. Todavia, isso ainda não foi possível e a autarquia ainda não avançou qualquer estimativa de data para a abertura, apesar da brevidade desejada. Depois da última salva de tiros disparada pela 2.ª Bateria do RAC em 10 de Dezembro de 1998, a intenção de criar o Museu ainda não passou disso mesmo.
NEGOCIAÇÕES ARRASTAM-SE NO TEMPO
No início de 2014, quando o propósito de avançar com o novo Museu foi anunciado pela autarquia, uma das premissas do acordo de princípios assinado na altura era que o projecto não se ficasse pela constituição do novo espaço museológico e do jardim e parque temático em redor, mas que promovesse também “o desenvolvimento de projectos de investigação sobre a defesa de costa e fortificação marítima”.
Segundo o acordo de princípios para conseguir alcançar um Protocolo de Colaboração entre a Câmara Municipal de Cascais e o Exército Português, assinado no final de Janeiro de 2014, esta vertente de investigação seria assegurada pelo Exército, em associação com os serviços da sua Biblioteca, o Arquivo Histórico Militar e o Gabinete de Estudos Arqueológicos da Engenharia Militar.
Na altura, estavam também em cima da mesa das negociações aspectos tão importantes como a listagem completa dos espólios a ceder pelo Exército e pelo Município de Cascais para o funcionamento do Museu, ou qual a posição da autarquia no que respeita ao aumento do acervo, através da aquisição de objectos e colecções. Pretendia-se também que as negociações pudessem “estar concluídas no mais curto espaço de tempo”.
O projecto apresentado tinha a assinatura das arquitectas Rita Herédia e Inês Bastos, que defendiam, como principais objectivos do seu trabalho, a necessidade de “preservar e dar destaque às peças e às instalações”, que seriam abertas aos visitantes, bem como “a valorização das potencialidades da Bataria da Parede”, sendo que o parque temático procuraria “conjugar o lazer com a História”. Assinalava-se ainda que as peças de artilharia manteriam o mesmo lugar de origem para que pudessem ser alvo de “visualização e de uma contextualização histórica”.
PROJECTO MUSEOLÓGICO CONTINUA ADIADO
Comentava o Presidente da CMC, Carlos Carreiras, em publicação datada de 12 de Fevereiro de 2014, na página da autarquia na internet (https://www.cascais.pt/noticia/museu-de-artilharia-de-costa-vai-nascer-na-parede), onde se referia que o projecto representaria um investimento de cerca de um milhão de euros: “Esta é claramente uma das melhores vistas de Cascais sobre a entrada do Tejo e vai ser um polo muito importante para preservarmos as nossas memórias, pelo que temos todos os ingredientes para um caso de sucesso”.
Na mesma altura, aquando da assinatura do ‘acordo de princípios’ entre a Autarquia e o Exército para a instalação do Museu e do Parque Temático, o autarca cascalense referiu que o projecto incluiria a área museológica e cinco hectares de espaços verdes, assinalando: “A Parede é uma freguesia muito urbana, que carece de verde e por isso decidimos aliar esta intenção de fazer um Museu Militar de Artilharia, já manifestada há muito, com a de construir um parque temático”. “O parque verde deve abrir ao público ainda este ano (2014), mas o museu deve demorar mais algum tempo. Vou tentar que esteja pronto até Junho do próximo ano (2015)“, prometia.
Há pouco mais de um ano, no final de Outubro de 2019, na página da internet www.operacional.pt (https://www.operacional.pt/bataria-da-lage-o-exemplo-da-associacao-de-comandos), dedicada a temas relativos à Defesa Nacional, às Forças Armadas e de Segurança, um artigo intitulado ‘Bataria da Lage, o Exemplo da Associação de Comandos’, assinado por Miguel Machado, apontava os exemplos de abandono das instalações militares localizadas no alto da Parede, no Monte de Santa Luzia: “…o estado de degradação a que se chegou obrigará a enormes investimentos para salvar o que ainda for possível, dois casos dos mais gritantes são as antigas 2.ª Bataria do RAC na Parede e a 7.ª no Outão”.
Este foi mais um alerta para o estado de abandono e degradação a que têm sido votadas as instalações militares ocupadas pela 2.ª Bateria do Regimento de Artilharia de Costa, no Monte de Santa Luzia, onde foram instaladas três peças Vickers de 152mm, de fabrico inglês, de médio alcance (10–20 quilómetros) e um posto de observação de contrabombardeamento. Resta saber quando será possível desbloquear as negociações que têm decorrido entre a CMC e o Exército Português para poder seguir em frente com o projecto museológico e torná-lo uma realidade.
REGIMENTO DE ARTILHARIA DE COSTA (RAC)
O Regimento de Artilharia de Costa (RAC) foi uma unidade militar especializada composta por oito batarias criada pelo Exército depois da II Guerra Mundial, através do Plano Barrow, desenhado por uma comissão militar anglo-lusa com o objectivo de assegurar a defesa da linha de costa no acesso aos portos de Lisboa e Setúbal.
Com base neste plano, instalou-se uma estrutura destinada a impedir o desembarque de uma força convencional apoiada por unidades navais em torno daqueles dois importantes portos estratégicos. As construções das várias infraestruturas militares, dotadas de canhões de longo alcance, decorreram entre 1944 e 1958.
A Artilharia instalada junto do litoral com o propósito de defender a costa portuguesa remonta ao reinado de D. Fernando I (1367-1383). No século XIV, os portugueses recorreram a canhões para proteger Lisboa dos ataques por mar da frota castelhana, tendo guarnecido com bocas de fogo as fortalezas das duas margens do rio Tejo.
Fui Militar neste quartel de 69 a 72 e fico triste quando vejo tudo ao abandono.