Pescadores de Portugal apresentam candidatura à UNESCO

Cascais sempre foi uma terra de pescadores. O rei D. Carlos, cuja estátua vigia a baía, era um monarca fortemente apaixonado pelo mar, que apoiava a investigação científica no domínio da Biologia Marinha e realizava expedições oceânicas com alguma frequência. Em 1896, chegou mesmo a mandar instalar na Cidadela de Cascais o primeiro laboratório de Biologia Marinha em Portugal. O carácter piscatório da vila integra-se na paisagem, também pela presença dos apetrechos de pesca junto ao paredão e pelos barcos fundeados em frente à Praia dos Pescadores, também conhecida como Praia da Ribeira, Praia do Peixe e Praia da Baía. 

A Associação de Armadores e Pescadores de Cascais (AAPC), através do Presidente da Direcção da instituição, Manuel Caçoa Lorigo, decidiu avançar para um projecto que pretende realçar a importância dos ‘homens do mar’ no quotidiano do País, de forma a promover a salvaguarda das suas tradições, usos, costumes, artes de pesca e particularidades de cada região. O jornal ‘O Correio da Linha’ foi ouvir as explicações dadas pelo coordenador da candidatura dos Pescadores de Portugal à classificação como Património Cultural Imaterial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO).

Jornal ‘O Correio da Linha’ (CL) – Em que consiste a candidatura dos Pescadores de Portugal a Património Cultural Imaterial da Humanidade? 

Manuel Lorigo (ML) – Esta candidatura consiste tão somente em fazer justiça aos Pescadores de Portugal, visto que foram eles que passaram os tormentos e as agruras no dia-a-dia em que se dedicaram à pesca, desde a fome à repressão existente no sector, que lhes era feita. Só por si, este cenário bastava para candidatar os Pescadores de Portugal a Património Cultural Imaterial da Humanidade. Acresce que, em 1 de Dezembro de 1947, morreram 179 pescadores durante uma tempestade ocorrida subitamente. Estas e muitas outras histórias, que terei oportunidade de narrar na candidatura, são razões mais do que suficientes para que a mesma seja considerada.

CL – Quais os argumentos apresentados para oficializar esta candidatura?

ML – Para além dos aspectos já referidos, acresce-se a ancestralidade da actividade da pesca, os ex-votos, as músicas e tradições, os trajes e a forma única de se vestirem, se bem que o acento tónico prioritário está nos naufrágios ocorridos ao longo da nossa costa, no Canadá, na Gronelândia, no Cabo Branco e em outras longínquas paragens. Sem rigor absoluto, creio que nos últimos 100 anos morreram afogados no mar mais de 1.500 pescadores portugueses.

CL – Quando é que a candidatura vai ser apresentada à UNESCO?

ML – A candidatura será apresentada quando estiver devidamente formalizada. Embora esteja bastante adiantada, ainda há retoques a considerar para que seja um modelo exemplar.

CL – O que falta fazer para avançar com a candidatura?

ML– Falta fazer o levantamento exaustivo da zona da Figueira da Foz para Norte.

Foto: Paulo Rodrigues

PESCADORES DE CASCAIS COORDENAM CANDIDATURA

CL – Quem está a coordenar esta candidatura?

ML– A coordenação da candidatura é da responsabilidade da Associação dos Armadores e Pescadores de Cascais, sendo eu responsável pelas pesquisas realizadas.

CL – Com que apoios oficiais contam para poder apresentar a candidatura?

ML – Como previamente tivemos o cuidado de comunicar a nossa intenção a todas as Câmaras Municipais Ribeirinhas, que por coincidência nos fizeram chegar documentos de interesse para análise, pensamos que o apoio poderá ser das mesmas.

CL – O que levou a AAPC a lançar esta iniciativa?

ML– Esta iniciativa é estritamente de pensamento pessoal da parte do autor. Tomei conhecimento que os Caretos são considerados Património Cultural Imaterial da Humanidade, os Campinos também apresentaram uma candidatura à UNESCO, bem como o Fado e o Cante Alentejano. Tudo isso mexeu comigo e entendi que os Pescadores de Portugal mereciam também esta candidatura.

CL – O que esperam conseguir com esta candidatura?

ML– Primeiro, esperamos conseguir que a candidatura seja aprovada. Segundo, queremos consagrar os ‘homens do mar’ com a classificação atribuída pela UNESCO. Terceiro, consagrar princípios que daí possam advir, os pescadores deixam de ser de a, b ou c e passam a ser Património Cultural Imaterial da Humanidade.

CL – Os Pescadores de Cascais têm o futuro assegurado?

ML– Penso que o futuro vai estar assegurado e vai ser certamente risonho.

CL – O que está a ser feito para preservar a memória dos Pescadores de Cascais?

ML– A preservação do Património existente encontra-se espalhada em diversos museus de Portugal, como por exemplo o Museu do Mar, onde estão amplamente preservados os trajes e as tradições ancestrais. Esse trabalho tem vindo a ser desenvolvido pela Dra. Maria Fernanda, que está sempre em contacto comigo.

CL – Falta em Cascais um museu exclusivamente dedicado aos Pescadores?  Os Pescadores de Cascais merecem esse reconhecimento?

ML– Não é imperativo que tenha de existir um museu, visto que já existe o Museu do Mar, no qual já estão perpetuadas as memórias dos pescadores de há muitos anos atrás.

Foto: Paulo Rodrigues

Autor: Luís Curado

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