Fernando Lousada: “Tanto dançamos para a Corte como para o Povo”

Os passos, estudados, estão bem ensaiados. Os trajes, confeccionados com rigor, denotam uma atenção especial aos pormenores. A música cativa, chama a atenção, faz voltar cabeças. Perante a surpresa de quem assiste, começa a dança, que prende olhares e resgata aplausos. Costumam ser assim as actuações do grupo de Danças Medievais criado por José Fernando Lousada, que originalmente interpretou outro tipo de danças perante parceiros de outras modalidades.

Depois de muitos anos a desenvolver a actividade de instrutor de defesa pessoal e a ensinar Artes Marciais, este amante da Cultura e das Tradições sentiu-se atraído pelas Danças de Salão, um gosto que acabou por despertar a curiosidade em torno das Danças Medievais no seguimento de um convite que recebeu para participar numa Feira Medieval, a primeira de muitas que se seguiram e que fizeram nascer um projecto que não tem parado de crescer.

Em 2015, surgiu o grupo de Dança Medieval ‘Pé de Dança’, que, após algumas alterações e adaptações necessárias para desenvolvimento do projecto, veio a dar origem ao ‘Grupo Medieval Viajar na Dança – Cascais’, integrado na associação com o mesmo nome, criada em 2019. Ao longo do percurso já cumprido, este grupo tem somado presenças em encontros culturais, feiras medievais, festivais de dança e outros eventos, onde tem conquistado o carinho do público.

O jornal ‘O Correio da Linha’ foi conhecer melhor o projecto destes embaixadores de uma época que suscita curiosidade e admiração. Uma época que ficou conhecida como A Idade Média e corresponde a um período da História da Europa que decorreu entre 476 d.C. (séc. V) e 1453 (séc. XV), com início na queda do Império Romano do Ocidente e final na tomada da cidade de Constantinopla pelo Império Turco-Otomano. Tem a palavra José Fernando Lousada:

Jornal ‘O Correio da Linha’ (CL) – Como surgiu esta opção pelas Danças Medievais?

José Fernando Lousada (JFL) – As Danças Medievais aparecem através da pesquisa que eu fui fazendo sobre as nossas tradições, despertando-me o interesse por esta área. Quando se colocou a possibilidade de apresentar danças medievais na primeira Feira Medieval de S. Domingos de Rana, no concelho de Cascais, preparei umas coreografias que resultaram bem.

Mais tarde, pensei que poderia criar o meu próprio grupo de Danças Medievais e foi o que fiz. Foi assim que surgiu o grupo de Dança Medieval ‘Pé de Dança’, em Dezembro de 2015, e que actualmente se chama ‘Grupo Medieval Viajar na Dança – Cascais’, porque criámos uma associação que não podia ter o nome ‘Pé de Fança’ por este já existir. Daí surgir o nome da Associação ‘Viajar na Dança – Cascais’, em Dezembro de 2019.

 

“A DANÇA TEM UM PAPEL CULTURAL MUITO IMPORTANTE”

 

CL – Qual a importância deste projecto em termos culturais?

JFL – É dar a conhecer como já antigamente, na Época Medieval, a Dança tinha um papel cultural muito importante tanto no meio palaciano como no meio campestre.

CL – Foram criados vários projectos desenvolvidos por si. De que forma se relacionam?

JFL – Todos os meus projetos estão inseridos na Associação ‘Viajar na Dança – Cascais’, que conta com várias secções, como a Dança Medieval, as Danças de Natal, os passeios e as caminhadas.

CL – Quantas pessoas colaboram nestes projectos? Dentro de que idades? Com que profissões?

JFL – O Grupo Medieval está inserido na Associação ‘Viajar na Dança – Cascais’ e é composto por 20 elementos, com idades compreendidas entre os 30 e os 80 anos. Temos pessoas com as mais diversas ocupações, desde empregados de escritório a professores, passando por funcionários públicos, auxiliares de educação e aposentados, entre outras.

CL – As actuações do(s) grupo(s) são remuneradas, ou é uma forma de ocupação dos tempos livres, um hobby, em que são solicitados para participar nos eventos de forma gratuita?

JFL – A maioria das actuações não é remunerada, pois é um hobby nosso que tentamos fazer com o maior profissionalismo possível. Quando não nos é disponibilizado transporte, solicitamos apenas que seja pago o transporte das deslocações e o alojamento, se necessário.

CL – Onde têm actuado? Em que eventos têm participado?

JFL – O grupo de Dança Medieval tem actuado em feiras medievais, castelos, museus, colectividades, lares e escolas. Temos participado em diversos eventos, entre os quais: as feiras medievais de Óbitos, Benfica, Alameda, Beato e Vila Ruiva (Cuba, Alentejo), Feira Quinhentista da Aldeia Galega (Alenquer), Feira de Lourosa, no Forte de São Bruno (Caxias, Oeiras) e Museu dos Coches. Mais recentemente, actuámos também na abertura do XV Colóquio Interdisciplinar sobre Provérbios, em Tavira.

Em relação às Danças de Natal, actuamos essencialmente em lares, centros de convívio, festas de Natal de colectividades e mercados de Natal.

DANÇAS DIVULGADAS NAS REDES SOCIAIS

 

CL – Como costumam divulgar o vosso trabalho?

JFL – Divulgamos o trabalho dos grupos sobretudo através de folhetos, nas redes sociais (Facebook, Youtube) e em boletins informativos.

CL – Quem pode integrar o grupo? Aceitam novos elementos? Quais as aptidões que os elementos do grupo devem possuir?

JFL – Aceitamos novos elementos no grupo, desde que mostrem empenho para aprender as coreografias, sejam assíduos e pontuais e tenham espírito de grupo. Inicialmente, todos os novos elementos têm de experimentar para ver se gostam e se têm aptidão para a dança.

CL – Como são escolhidas as músicas que dançam? Têm um reportório fixo?

JFL – Fizemos uma pesquisa sobre o reportório pretendido, que foi cuidadosamente escolhido para diferenciar as músicas dançadas pela Corte e as músicas dançadas pelo Povo. Normalmente, o nosso reportório é fixo, mas se nos solicitarem algo muito concreto também tentamos dançar.

CL – Onde vão recolher os temas que dançam? Como fazem a escolha?

JFL – As Danças Medievais são difíceis de construir, pois há poucos registos das coreografias, pelo que a maioria das minhas pesquisas é feita através das pinturas e dos azulejos da época, a partir dos quais vou conseguindo perceber e recriar os movimentos das danças.

CL – Quem escolhe os temas?

JFL – Sou eu, que sou o coreógrafo e ensaiador do grupo.

CL – Quem confecciona os trajes que usam nas actuações? Em que se inspiram?

JFL – Fazemos pesquisa do estilo de trajes que se usavam na Época Medieval, tal como as respectivas cores. De momento, uma vez que a associação ainda não tem posses, cada elemento do grupo é responsável por mandar fazer a sua roupa à costureira, de acordo com o parecer da pessoa responsável.

CL – Costumam actuar com músicos ao vivo, ou as músicas são previamente gravadas?

JFL – Costumamos actuar com música previamente gravada.

CL – O grupo conta com algum apoio para desenvolver a sua actividade? Nomeadamente da Câmara Municipal e da Junta de Freguesia?

JFL – Uma vez que a associação é recente, e também devido à crise sanitária, só agora demos conhecimento da nossa existência à Câmara Municipal de Cascais (CMC) e à Junta de Freguesia de Cascais e Estoril (JFCE). De momento, aguardamos reunião com estas duas instituições.

A maior necessidade que temos sentido é de transporte para algumas deslocações mais distantes e que a Junta de Freguesia de Alcabideche tem cedido à Associação Recreativa da Juventude Carrascalense (ARJC), local onde ensaiamos todas as semanas, pela pessoa do Sr. Presidente Rui Abreu, que também faz parte do grupo de Dança Medieval.

Usamos aquele espaço cedido pela ARJC para ensaiar, uma vez que não temos sede com condições para tal. Às vezes, quando as condições climatéricas o permitem, também fazemos alguns ensaios ao ar livre.

PANDEMIA OBRIGA A REDUZIR ACTUAÇÕES

 

CL – Qual a maior dificuldade que têm sentido com a crise sanitária que enfrentamos?

JFL – Temos tido poucas actuações.

CL – Que soluções têm encontrado para superar isso?

JFL – Temos continuado a divulgar o nosso trabalho através do Facebook e do Youtube com ensaios e actuações.

CL – Quais os principais eventos em que contam actuar durante o presente ano? Já receberam contactos/convites nesse sentido?

JFL – Sim. Já recebemos convites, nomeadamente para o Castelo de Tavira. E também já temos em vista algumas feiras medievais.

CL – Como tem reagido o público às actuações do grupo? O Período Medieval suscita muita curiosidade? Durante as actuações é feito algum enquadramento histórico?

JFL – O grupo tem registado muita aceitação e curiosidade por parte do público, pois tentamos no final de cada actuação interagir com os espectadores. No início dos espectáculos, fazemos sempre um enquadramento histórico.

CL – Estão a desenvolver algum programa especial junto das escolas do concelho de Cascais, ou de outras localidades do País?

JFL – Temos de momento um projecto para apresentar à CMC e à JFCE, juntamente com outros projectos futuros que estamos a preparar.

BREVE CURRÍCULO

José Fernando Lousada é fundador e ensaiador do Grupo de Canto e Dança de Oeiras integrado no Centro de Cultura e Desporto 477, uma associação sem fins lucrativos criada em 1961 por um grupo de funcionários da Câmara Municipal de Oeiras e dos Serviços Intermunicipalizados de Água e Saneamento (SIMAS) locais. É também coreógrafo e ensaiador de marchas populares, nomeadamente em Oeiras, Carcavelos e Tires.

Durante muitos anos, Fernando Lousada desempenhou também funções como instrutor de defesa pessoal e professor de Artes Marciais. Um dia, foi desafiado a experimentar outro tipo de passos numa modalidade diferente: Danças de Salão. Esta nova actividade depressa o conquistou, acabando por desenvolver um gosto especial que lhe permitiu entrar em competições de dança desportiva e ganhar vários prémios.

Ainda neste domínio das Danças de Salão, aproveitou um espaço de que dispunha em Cascais para dar aulas de dança a um grupo de amigos, que depois faziam exibições em várias instituições. Foi assim que foi criado, em 2015, o grupo ‘Pé de Dança’, que volvidos quatro anos deu origem à Associação ‘Viajar na Dança – Cascais’, da qual José Fernando Lousada é presidente, coreógrafo e ensaiador.

GRUPO DE CANTO E DANÇA

O Grupo de Canto Dança (GCD) do Centro de Cultura e Desporto (CCD) da Câmara Municipal de Oeiras (CMO) e dos Serviços Intermunicipalizados de Água e Saneamento (SIMAS) locais foi fundado por José Fernando Lousada em 19 de Dezembro de 1992, preparando-se para assinalar no final deste ano três décadas de existência. Ensaiado pelo seu fundador, o grupo tem como objectivo divulgar um pouco da cultura musical de todas as regiões do País.

Registando ao longo dos anos algumas oscilações na sua composição, o GCD conta actualmente com 25/30 elementos, entre dançarinos e músicos. Mantém uma actividade constante desde a sua estreia, com actuações de Norte a Sul do País, incluindo os Açores e a Madeira, além de deslocações ao Norte de Espanha e ao Brasil.

Desde a sua fundação, o grupo tem vindo a colaborar nas mais diversas iniciativas promovidas por municípios, colectividades e associações de beneficência, entre outras instituições, divulgando através dos seus espectáculos a diversidade musical de todas as regiões do continente e ilhas.

Habitualmente, um grupo folclórico dedica-se exclusivamente à música da região em que está inserido. No caso do GCD, não sendo um grupo folclórico de raiz, interpreta, não só músicas de cariz popular, mas também temas clássicos da Música Ligeira Portuguesa recriados com coreografias originais de José Fernando Lousada.

Autor: Luís Curado

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