“Procuramos ter uma interacção de proximidade com os agentes locais”

Em consequência da pandemia COVID-19 foi necessário um esforço por parte de toda a sociedade para se adaptar às novas circunstâncias, esforço que não deixou de fora os organismos públicos. Foi no sentido de dar a conhecer como é que uma junta de freguesia (que é quem, na máquina do Estado, está normalmente mais perto dos cidadãos) se movimentou para dar respostas às necessidades da população e em que medida o está a fazer, que o jornal ‘O Correio da Linha’ conversou com a presidente da União de Freguesias de Oeiras, Paço de Arcos e Caxias, Madalena Castro.

Jornal ‘O Correio da Linha’ (CL) – Como é que a União de Freguesias (UF) tem vivido estes meses de uma realidade que surpreendeu a todos?

Madalena Castro (MC) – A UF teve que se adaptar a esta nova realidade, que nos fez repensar a vida e mudou a forma como lidamos com os nossos cidadãos. Foram implementadas algumas medidas inovadoras que se adequaram a este estado de pandemia que estamos a viver. A vida da UF continuou, temos um grupo de trabalhadores que se empenhou em ter a UF constantemente aberta, não fechámos nenhum dia, mesmo em situação de emergência. Entendemos que nestas circunstâncias surgem situações de carência que, estando nós na linha da frente e sendo a primeira instituição a quem as pessoas recorrem, devemos estar disponíveis para ajudar, na medida das nossas possibilidades.

“HÁ MAIS PEDIDOS DE APOIO SOCIAL DE FAMÍLIAS”

CL – Houve um grande aumento de pedidos de apoio?

MC – Em Oeiras verifica-se um aumento de cerca de 20% actualmente. No início foi menor, notando-se presentemente que há mais pedidos de apoio social de famílias, estando nós a apoiar cerca de 600 pessoas com ajuda alimentar. Não incluo neste apoio as ajudas da Câmara de Oeiras ao nível da comparticipação no pagamento de rendas de casa, de electricidade, gás e água. Temos uma parceria com a Câmara, em que nós analisamos os processos que nos chegam e encaminhamos para a autarquia os pedidos de ajuda, sendo que 99,9% desses pedidos são atendidos.

CL – São mais as pessoas ou famílias que perderam rendimentos, ou as que já tinham dificuldades?

MC – A maioria já tinha dificuldades, talvez mais de 50% trabalhavam na chamada economia informal, com trabalho em casas de famílias, mas há também agentes imobiliários que não vendem nada desde Março, ou profissões liberais que deixaram de ter serviços. Uma boa parte dessas pessoas não são portugueses, são brasileiros ou de países do Leste, que se viram sem rendimentos e sem perspectiva de melhorias. 

CL – Apareceram situações extremas de carência?

MC – Não temos conhecimento de situações extremas, a Câmara de Oeiras e as juntas de freguesia têm difundido que em Oeiras não há necessidade de as pessoas passarem fome ou terem carências absolutas de vivência diária. Penso que essa mensagem tem chegado a quem precisa. Temos procurado junto das instituições de solidariedade e dos nossos parceiros que esta mensagem seja divulgada, não só junto das famílias, mas também dos isolados, sobretudo seniores, e pedimos a toda a comunidade que nos sinalize as situações de carência.

É uma questão de justiça que se refira o trabalho desenvolvido pelas IPSS, como a Santa Casa da Misericórdia, o Centro Social e Paroquial de Oeiras ou o Centro Social e Paroquial Nossa Senhora das Dores, que através de voluntários, como os escuteiros e membros de irmandades, levam às residências dos idosos medicamentos, compras ou alimentação confeccionada. Temos orgulho em dizer que em Oeiras não são conhecidas situações de tragédia absoluta, nem ao nível da saúde nem das necessidades básicas.

CL – No caso dos deficientes, como é a situação?

MC – Estamos em contacto com o Centro Nuno Belmar da Costa, sabemos que tiveram que fazer adaptações a esta nova realidade, não podem ter os utentes em permanência, e a UF está disponível para ajudar no apoio que prestam. Pelo que sabemos, está tudo a correr bem.

Foto: Paulo Rodrigues

“O EXECUTIVO DA UF APROVOU UM PLANO DE CONTINGÊNCIA”

CL – O futuro não parece ser muito sorridente no que respeita à pandemia. Da parte da UF, já existe um plano para os próximos tempos, ou vai ser mantido este funcionamento?

MC – O Executivo da UF aprovou um plano de contingência quando a DGS o determinou, que se mantém em vigor e vai manter-se, mas nós temos uma norma para implementar se a situação se agravar, nomeadamente no que se refere ao funcionamento dos postos de atendimento e ao nível teletrabalho, deixando de estar na UF os funcionários que podem fazer o seu trabalho em casa. Para isso, foi providenciada a compra de computadores, mas vamos procurar manter sempre o atendimento presencial.

Atualmente, 80% do atendimento que fazemos é com marcação, mas em situações como a entrega de máscaras, não há essa necessidade, as pessoas chegam tiram uma senha e aguardam a sua vez no exterior das instalações. A entrega de máscaras está apenas condicionada à apresentação de um documento que prove que vivem no concelho de Oeiras, como o cartão de cidadão.

CL – O Centro de Enfermagem de Caxias continua a funcionar?

MC – Sim, continua e com muita procura, que julgo que se justifica pela proximidade e pela simpatia com que as pessoas são tratadas. O atendimento é feito por marcação, e em Março foi deliberado que os cuidados de enfermagem passassem a ser gratuitos.

CL – A pandemia provocou também alterações nas restantes áreas de competência da UF?

MC – O plano de actividades da UF centra-se nas áreas da Acção Social, do Desporto, da Cultura, da Educação e na execução da Delegação de Competências. Na Delegação de Competências, que tem um peso financeiro de cerca de 50% das receitas da UF (que se não fosse essa verba não chegaria aos 600 mil euros) privilegiamos, quer nas intervenções nas infraestruturas, quer no Ambiente, as intervenções nas escolas, estamos num regime de complementaridade com a Câmara a fazer a requalificação de vários equipamentos escolares.

Ao nível do espaço público, fazemos intervenções em calçadas, reposição de sinalizações horizontais e verticais. Na manutenção dos jardins temos colaborado com a Câmara devido às dificuldades criadas com o atraso na concretização dos resultados do concurso para manutenção dos espaços verdes, uma situação a que é alheia a Câmara Municipal.

São feitos pela UF muitos pequenos trabalhos que, não tendo grande visibilidade, contribuem para a qualidade de vida dos munícipes.

CL – Julgo que vão fazer obras nas delegações de Paço de Arcos e Caxias… 

MC – Sim, vamos requalificar as delegações em colaboração com a Câmara de Oeiras, em Paço de Arcos para melhorar as condições de atendimento e em Caxias é preciso resolver alguns problemas da cobertura. 

Entretanto, além das intervenções que já referi, ao nível da Cultura estamos a procurar dar ajuda a agentes culturais, como o TIO (Teatro Independente de Oeiras) ou a Matraca (organização dedicada à criação, promoção, organização e divulgação de projectos artísticos), e na área do Desporto também temos contactado os clubes e associações dando o apoio que podemos. 

Na área da Educação não foi possível este ano concretizar nenhum projecto, mas o que estamos a fazer é ajudar a criar condições para as escolas poderem realizar os seus objectivos.

Foto: Paulo Rodrigues

“AS JUNTAS DE FREGUESIA DEVIAM SER DOTADAS DE OUTROS RECURSOS”

CL – A presidente de Junta assumiu funções em 2017, depois do trabalho como vereadora. Como é que tem sido esta nova experiência?

MC – Na primeira fase foi a descoberta do que é uma Junta de Freguesia. A gestão de um pelouro da Câmara não tem nada a ver com a gestão de uma junta, quer pelos recursos financeiros, quer pelos técnicos, que a junta não tem, é uma abordagem completamente diferente. As juntas de freguesia deviam ser dotadas de outros recursos, essencialmente ao nível da estrutura orgânica. Todo o chapéu legal que as juntas de freguesia têm que cumprir ao nível, por exemplo, da implementação de medidas de segurança com os seus trabalhadores, ao nível da formação, da contratação pública, requer competências técnicas que as juntas não têm, dando-se o facto de, ao contrário do resto do País, Lisboa ter essas competências atribuídas às juntas, o que considero uma injustiça, porque Lisboa é uma realidade e o resto do País é outra. 

Expresso o meu protesto, porque não me parece que num país democrático deva haver diferenças, porque é injusto. Esta questão devia ser objecto de reflexão pelos nossos governantes, porque ou as juntas de freguesia são a linha da frente das câmaras e resolvem apenas as situações de mais urgência ou, se se pretende que tenham uma maior intervenção ao nível do território, deveriam ser dotadas de outros instrumentos técnicos e financeiros.

CL – Sente alguma frustração ao fim deste tempo?

MC – Ao longo deste tempo foi preciso aprender a viver com esta realidade, reorganizar os serviços, motivar as pessoas, o que implica uma alteração de comportamentos e de mentalidades, que por vezes não é fácil. Por outro lado, procuramos ter uma interacção de proximidade com os agentes locais, quer seja na área Social, no Desporto ou na Cultura, e fomos implementando o funcionamento em rede das delegações de forma a prestar o melhor serviço aos cidadãos, fazendo com que as pessoas sintam que os seus problemas e as suas necessidades têm consequência, ou seja, chegam a quem os pode resolver, nomeadamente à Câmara Municipal.

Alargámos muitas das intervenções, particularmente no âmbito social, abraçámos o Banco Alimentar, em substituição das Vicentinas, que não podiam continuar face aos problemas da pandemia, aderimos ao programa operacional de apoio a pessoas carenciadas, temos uma equipa muito motivada, não sinto nenhuma frustração.

CL – Consta que vai haver nova sede para a UF. Para quando essa realidade?

MC – O processo está em andamento, já enviámos as caraterísticas de como deve ser a nossa sede e reunimos com a Unidade Orgânica da Câmara de Oeiras, que é o Departamento de Projectos Especiais. Sabemos que o presidente da Câmara já deu ordem para o projecto avançar e deverá estar pronto em 2021.

A execução do projecto depende da construção do novo quartel da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Oeiras, uma vez que, desocupado o actual quartel, serão feitas as obras de adaptação para nesse edifício poder ser instalada a nova sede da UF.

Autor: Alexandre Gonçalves

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